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quinta-feira, 11 de junho de 2015

Teatro – A Casa de Bernarda Alba pelos alunos do Agrupamento de Escolas José Régio

O céu tem mais 12 estrelas

Regra número um do teatro: nunca subestimar o trabalho dos adolescentes. A provarem-no, doze raparigas pisaram o palco do Centro de Artes do Espectáculo de Portalegre, na noite de 3 de Junho passada, para brindarem o público com uma soberba apresentação da peça de Federico García Lorca.
Se houve uma crítica a ser apontada, e oportuna, foi a da projecção de voz, que em alguns casos constitui um óbice à apreensão do texto e provocou algum desnivelamento entre as actrizes. De resto, a gestualidade, a movimentação em palco, a fluência discursiva e cinética, o ritmo perfeito de entradas e “deixas” ao nível do mecanismo de precisão, permitiu constatar a versatilidade das actrizes e a sua capacidade para se superarem, como de resto aconteceu.
Não seria necessário admitir a força e competência dramáticas com que Inês Carvalho (Bernarda Alba), já acostumada a estas andanças, salientou a impiedade da personagem que vestia; Beatriz Miranda (Adela) revelou-se genial na assunção da sua tragédia pessoal autodestrutiva; Patrícia Meira (Martirio) foi irrepreensível na captação da sua opressão contida e na inveja apocalíptica que a consumia (é bom que pense a sério um futuro na dramaturgia); magistrais foram igualmente Leonor Caiola (Madalena) – cuja presença em palco foi soberana, dominadora, seguríssima – e Margarida Lopes (Amélia), no papel dificílimo de personagem conciliadora, o que só um actor que sabe exactamente o que está a fazer consegue (e a Margarida fê-lo sem espinhas – outro caso de stage instinct); Ana Teles (Angustias) soube aguentar magnificamente o calvário gradual da sua fragilidade e desmoronamento, mais a mais quando esta se constituiu a sua estreia; Bárbara Galego (Poncia) voltou a maravilhar-nos com o seu instinto de palco, uma força que subjuga e que apenas pecou pelo volume de voz (mas imensamente criativa); Laura Pascoal (criada) compreendeu e apreendeu de forma impecável o código dos requintes de malícia, astúcia e esperteza; Inês Bandeiras (Maria Josefa) soube arrancar a ferros o vigor contraditório da loucura; e Mafalda Flores (rapariga e pedinte), Carolina Augusto (mulher e Prudência) e Ana Valério (mulher enlutada) não concederam um milímetro à facilidade, em papéis menores mas de importância dramática fundamental.
É por isso que a convicção com que cada uma das actrizes se entregou à personagem que cada uma assumia só poderia resultar nessa conclusão sensata: o teatro de escola é uma matéria séria, provocadora e, quando levada aos limites da competência, pode subjugar o público mais exigente. Às vezes acontece sem darmos por isso.
No final, Cristina Santos, a directora do Agrupamento de Escolas José Régio, agradeceu a interpretação transcendente das alunas e a presença do público, admitindo que gostaria de manter a continuidade deste projecto teatral.
O Grupo de Expressão Plástica e Dramática daquela escola conclui agora um ciclo de trabalho e despede-se por uns tempos da actividade, depois de ter encenado, entre outras peças, Rato Mickey (Hélder Costa), a Árvore Sem Luzes (Olivier Prou), Lianor no País Sem Pilhas (Armando Rosa), Os dois Corcundas e a Lua (Richard Demarcy), Diatribe de Amor Contra um Homem Sentado (Gabriel García Márquez) e As Mãos de Abraão Zacut (Luís de Sttau Monteiro), peça esta apresentada na Assembleia da República, integrada na memória do Holocausto. 
(texto- António Pascoal|fotos-D.R.)