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segunda-feira, 1 de junho de 2020

A história de uma criança do passado, no Dia Internacional da Criança

Em 1925, foi proclamado em Genebra o Dia Internacional da Criança durante a Conferência Mundial para o Bem-estar da Criança, sendo celebrado desde então em 1 de Junho em vários países.

A partir dessa data até ao presente 1 de Junho de 2020, muitas foram as crianças com várias histórias para contar.
A história desta criança começa numa cidade do Alto Alentejo em pleno Estado Novo, com António de Oliveira Salazar (Presidente do Conselho de Ministros) e o General Craveiro Lopes como Presidente da República. Nascida numa família considerada ‘remediada’ como se dizia então, tinha uma alimentação variada (carne e peixe), as roupas de inverno e as de verão e, até chegou a usar calça e meia do tipo anglo-saxónico (meia em xadrez e calça no mesmo padrão até ao joelho), camisa e pulôver em bico.
Na escola primária foi confrontada com as primeiras descriminações do Estado Novo, que tinha construído ao longo do país Escolas Primárias para rapazes e raparigas - que não se podiam juntar. 

A mãe fazia todos os dias o caminho do alto da cidade até à escola, onde debaixo do alpendre situado nas traseiras, dispunha num banco corrido uma pequena toalha onde colocava o almoço. A criança escarranchava-se no banco para fazer a refeição. Uma refeição onde podia estar no prato um bife com ovo e batatas fritas, como iscas de fígado ou peixe. Ao seu redor juntavam-se algumas crianças suas companheiras de aulas, cujos olhos se esbugalhavam para as iguarias que o seu companheiro degustava. Impressionada a criança, por vezes compartia a sua refeição com alguns deles, sob o olhar cúmplice da mãe. Alguns faziam quilómetros para chegar à escola levando uma pequena bolsa de tecido barato, que continha um pedaço de pão, por vezes já duro, que seria consumido com azeitonas ou um pedacito de queijo. 
A criança na sua tenra idade não conseguia compreender, porque os outros meninos não se vestiam como ele e não tinham a mesma comida. Afinal o direito das crianças que era reconhecido, na prática não era aplicado. Pouco tempo mais tarde surgiram então as cantinas escolares…
A criança tornou-se menino e, por circunstâncias da vida, foi viver para a região da capital, em pleno grande desenvolvimento da indústria, onde primavam os grupos Mello; Champalimaud; Mundet; Jorge Brito; a banca; Sacor; a Sociedade Central de Cervejas; o grupo Conde da Caria; a SONAP; o Entreposto o grupo ITT, entre outros ligados ao regime vigente.
Nessa grande vila onde passou a viver, longe do seu Alentejo, sentiu a discriminação (tema tão premente na actualidade) mas que não sabia o que era. Sabia sim que o humilhavam, tratavam-no por alentejano e era constante a chacota por causa da sua pronúncia. O menino começou por se empertigar e fazer frente a quem o queria humilhar, acabando por se integrar no grupo dos rapazes vizinhos e fazer-se respeitar. Mais uma vez os direitos da criança eram reconhecidos mas, por vezes até as crianças são cruéis entre elas.
De criança e menino, passou à juventude, fez-se Homem, constituiu família e chegou a idoso, o que lhe confere a ‘sabedoria’ que a idade vai acumulando. Continua no entanto a questionar-se porque há no Mundo segundo a Unicef - O Relatório A Situação Mundial da Infância 2019: Crianças, Alimentação e Nutrição (The State of the World’s Children 2019: Children, food and nutrition) revela que "pelo menos 1 em cada 3 crianças com menos de cinco anos - ou mais de 200 milhões - está desnutrida ou com sobrepeso. Quase duas em cada três crianças entre os seis meses e os dois anos de idade, não recebem alimentos que potenciem um crescimento rápido dos seus corpos e dos seus cérebros. Esta situação pode prejudicar o desenvolvimento cerebral, interferir com a sua aprendizagem, debilitar o seu sistema imunológico e aumentar o risco de infecções e, em muitos casos, de morte".
Pode ser o dia para celebrar mas, sobretudo, deve ser este e todos os dias seguintes para reflectir, pois como diz o Evangelho “Deixai vir a mim as crianças, porque delas é o Reino dos Céus. (S.Mateus) ”.(Foto-D.R.)